sábado, 14 de março de 2009

A química do amor


Assim que Ag e C se conheceram, eles logo souberam que eram reagentes-metade e haviam sido feitos um para o outro. Quando eles se olharam pela primeira vez saíram raios iônicos de seus olhos. Foi o que pode se chamar de reação à primeira vista.

O namoro teve diversas fases. Com o passar do tempo o relacionamento foi se solidificando e então aumentaram as pressões para que oficializassem essa reação.

Ele, em um grande gesto de amor, deu-lhe uma aliança de Au, ela ficou super emocionada. Era uma prova de que eles iriam compartilhar todos os seus elétrons.

A cerimônia de casamento foi marcada para dali algumas semanas, no Erlenmeyer. A lista de convidados foi feita a partir da tabela periódica, só seriam convidadas pessoas de família, e como o noivo era de muita solubilidade a imprensa daria algumas notas a respeito na coluna social.

Ela até fez um regimezinho para diminuir o seu número de massa e entrar no seu vestido de noiva, de modelo atômico. Ambos irradiavam felicidade e radioatividade por todos os prótons, haviam finalmente descoberto a fórmula do amor.

Casaram-se em comunhão total de elétrons, numa cerimônia que tinha átomos como padrinhos e moléculas como madrinhas, todos vestindo trajes leves devido à grande calorimetria do verão.

Os noivos estavam fora de orbital, especialmente porque passariam a lua-de-mel no diagrama de Pauling.

Ag tinha planos de ter muitos molzinhos e sonhava com as suas bodas de prata.

Na volta da viagem retomaram a vida normal: ela, atriz, passava grande parte do tempo em seus tubos de ensaio; ele, advogado, estudava a fundo as leis de Hess, Dalton, Proust, Lavoisier, Charles, Boyle - Mariotte, Gay - Lussol e Avogrado.

Ele dizia que tinha um milhão de nêutrons a mais que ela, mas ela nem ligava, ambos eram bastante inteligentes.

Havia, é claro, algumas diferenças básicas de personalidade: ele era muito radical, reativo e tinha problemas de gases. Ela queria tornar-se um fenômeno químico no teatro, e caráter metálico para isso não lhe faltava.

A alimentação deles era composta basicamente por substâncias simples, e ele também tinha funções inorgânicas nos serviços domésticos.

Até que um dia, por haverem desprezado o princípio da conservação de energia, houve um desgaste natural. C disse que ele era hipertenso e que aquela reação estava muito cheia de NaCl. Houve uma dupla troca de insultos:

- Você é uma cinética!
- Seu carbogeste!

Ela estava muito brava e passou toda a semana com um enorme bico de Bunsen, em profunda ebulição.

O casamento deles não era mais uma base sólida, a estequiometria existente entre eles parecia chegar ao fim.

Ela descobriu que o tempo todo ele a enganara: era tetravalente e tinha três outras ligações. Seu mais recente caso era com uma substância que de pura não tinha nada.

Ele agora era um alcoólatra, não vivia sem CH3OH. Até que um dia, após misturar bebidas fermentadas e destiladas, dirigindo bêbado e em movimento Browniano, causou um enorme acidente, atropelando e matando um hidrôgenio. Sua vida mais parecia uma usina nuclear, tinha explosões de raiva a todo instante.

O casamento deles era uma reação reversível, a solução encontrada foi uma separação por cristalização. Houve algumas discussões quanto à divisão das propriedades elétricas, ambos queriam ficar com o Ra.

Ag chorou muitas lágrimas de H2O, sua vida perdeu o brilho e ela recuperou o seu antigo número de massa. As coisas estavam literalmente pretas para ela.

C foi preso e condenado a dez anos de cadeia carbônica saturada, seus conhecimentos de leis não foram suficientes para salvá-lo.

Com o tempo acabou ficando amigo de um ciclano com quem veio a ter o primeiro relacionamento homogêneo da sua vida.

A vida de Ag teve uma enorme variação de entalpia, mas por mais que negasse, os sentimentos dela por C não haviam se evaporado por completo.

Ela conheceu diversos isóbaros, isótopos, isótonos e isoeletrônicos, teve diversas experiências, algumas até com cátions e ânions. Um de seus namorados deu-lhe até um anel benzênico, mas não adiantou.

Seu coração estava muito machucado, com apenas 25 anos teve que fazer uma ponte de hidrogênio.

3 comentários:

  1. Cara!!!
    Qta criatividade!!! Prosa com a química eu nunca tinha visto!!!
    Adorei!!!
    Parabens para minha amiga (irmã do coração) mega criativa!!!!
    Muito orgulho de ti!!
    Bjao e fique bem!!!

    ResponderExcluir
  2. Nossa....quem disse que você não gosta de química!!!

    Adorei...

    Poderia escrever historias para as crianças aprenderem, estilo teatrinho!!

    Bjuss
    te amo
    Picci BULL sobria

    ResponderExcluir
  3. Tete!!!
    =)

    Eu não lembro mais nada de quimica!!!
    Adorei a prosa!!!

    Beijosss,

    BETO

    ResponderExcluir